
Um pequeno prédio de quatro andares no tradicional Bairro Alto de Lisboa é a mais brasileira das casas em Portugal. Para falar sobre a Casa do Brasil de Lisboa, convidamos Carlos Henrique Vianna, um de seus fundadores e ex-presidente. Entre as suas muitas atividades, como Chef e escritor, Carlos Henrique é o representante da comunidade brasileira junto ao Conselho das Migrações, órgão consultivo do governo português.
Wave – Como surgiu a ideia de criação da Casa do Brasil de Lisboa?
Carlos Henrique – A Casa do Brasil de Lisboa (CBL) é uma associação civil sem fins lucrativos fundada, oficialmente, em janeiro de 1992 por brasileiros residentes em Portugal e portugueses amigos do Brasil, aberta a todas as nacionalidades. Nasceu da iniciativa de um grupo alargado de pessoas, de forma natural, sem qualquer interferência de outras instituições. A Casa do Brasil é laica e apartidária, porém não apolítica.
Wave – Quais são os objetivos e a missão da Casa do Brasil de Lisboa?
Carlos Henrique – A CBL tem mantido uma linha de coerência no discurso e na prática da associação. Esta linha de coerência se reflete num discurso político de afirmação do eixo da luta dos imigrantes em Portugal e na Europa: a luta pela cidadania. A CBL rejeita o discurso e a prática da assistência social, dos “coitadinhos”, duma certa visão presente no Estado e em parte da sociedade que veem os imigrantes como uma minoria frágil a proteger socialmente. Queremos ser cidadãos com os mesmos direitos e deveres que os portugueses, respeitadas as exceções contidas na Constituição. As lutas pelos direitos dos cidadãos e a afirmação da prática da cidadania dos (e pelos) imigrantes em Portugal têm sido, permanentemente, o nosso norte. Nossa visão para os próximos 30 anos: uma comunidade de brasileiros e brasileiras em Portugal à qual se pudesse chamar, verdadeiramente, de comunidade.
Wave – O que a CBL oferece a seus associados?
Carlos Henrique – A CBL tem um gabinete de orientação e informação para esclarecer dúvidas e ajudar os imigrantes na sua relação com o país e o Estado português. Tem o grupo ACOLHIDA, há muitos anos, para ajuda e socialização. Faz eventos culturais, de informação e debates, regularmente. Recentemente participou na coordenação e gestão do Fórum Social Europeu para as Migrações. Faz aconselhamento jurídico a seus sócios. Participa de vários projetos que visam ao empoderamento dos imigrantes na sociedade portuguesa. Estamos também presentes com regularidade na comunicação social.

Wave – Em quase 30 anos de atividade, quais foram os projetos mais marcantes desenvolvidos pela Casa?
Carlos Henrique – Foram muitas as conquistas. A maior foi o Acordo Lula de 2003, que possibilitou a regularização de cerca de 20 mil brasileiros. Mais do que isto, criou um precedente favorável que influenciou a adoção de várias medidas legislativas e governamentais favoráveis aos imigrantes nos anos que se seguiram.
Outros momentos marcantes: o 1º Simpósio Internacional sobre a Emigração Brasileira, em 1997, organizado em conjunto com a Universidade de Campinas e o Consulado em Lisboa (neste evento, o entrevistador e um colega do Canadá estiveram presentes); o 1º Encontro Ibérico da Emigração Brasileira, organizado em conjunto com a Procuradoria-Geral da República em 2002 e, em 2009, participou da 1ª Conferência de Brasileiros no Mundo, que significou um novo avanço na sistematização de políticas públicas do Estado brasileiro em relação a nós, emigrantes. Em Portugal, a CBL tem sido um interlocutor permanente do Estado português.
Wave – Quais os principais parceiros da Casa e como é o seu relacionamento com o Consulado-Geral de Lisboa e a embaixada do Brasil em Portugal?
Carlos Henrique – A CBL concorre continuamente a programas de apoio a entidades sociais, quer do Estado português, das Câmaras de Lisboa e Sintra e também da União Europeia. Tal representa a maior parte de suas receitas, que permitem ter já há alguns anos um pequeno corpo profissional que atende os imigrantes e quem a ela acorra.
Desde a destituição da presidenta Dilma, nossa relação com as representações oficiais do Estado brasileiro diminuiu muito. Com o consulado, mantém-se canais de comunicação. Com a embaixada não há relação. Tal situação agravou-se com a eleição de Bolsonaro. A CBL está conscientemente na oposição ao governo Bolsonaro.
Wave – Qual a participação da CBL no atendimento aos brasileiros durante a pandemia da Covid-19?
Carlos Henrique – Juntamo-nos a várias iniciativas do governo português e da Câmara de Lisboa para informar, através de diversos meios, os imigrantes sobre a COVID. Apoiamos iniciativas de distribuição de alimentos para os casos mais críticos, em parceria com uma outra entidade ligada à comunidade: a Associação Lusófona de Cidadania e Cultura (ALCC).

