Opinião – As alternativas do consumo brasileiro em tempos de recessão


por Rogério Silva

porcoPasso pela porta do restaurante chique da rua de cima da minha casa. Ele está sempre no meu caminho. Não é da minha safra de lugares frequentáveis. Tem ticket médio além do meu orçamento quinzenal. Mas, olhando atentamente, enxergo uma faixa. Está escrito “Self Service a preço promocional”. É o mercado adaptando-se a uma nova perspectiva.

O Brasil está em recessão desde o final de 2014. Talvez este primeiro semestre de 2016 seja o ápice da crise, visto que no campo político não houveram mudanças significativas que reflitam no cenário econômico. Uma pesquisa Data Popular – instituto surgido pela ascensão da Classe C no Brasil na década passada – do último mês de janeiro ouviu 3 mil e 500 pessoas em 153 cidades. O resultado mostra que, de cada dez brasileiros, nove não consumiram, no ano passado, algo que consumiam antes com regularidade.

Adotaram substituições

Outro dado interessante: 40 a 65% dos brasileiros que planejaram algum evento especial – uma viagem de férias, uma festa, a troca do carro ou mudança para um endereço melhor – não concretizaram o programado. Desistiram do sonho em função de determinada limitação financeira. O poder de compra diminuiu, motivado pela volta da inflação anual de dois dígitos e pela taxa básica de juros próxima dos 15% ao ano. Está mais difícil parcelar compras sem acréscimo e o salário não é suficiente para os artigos de consumo – produtos e serviços – que os emergentes conheceram na abundância.

RecessãolDe fato, o verbo correto é “conhecer”, conjugado no passado. Esse beliscão num padrão de consumo superior não chegou a qualificar o brasileiro como habitué de um degrau acima da pirâmide. A viagem de volta da classe C à classe D é de ônibus. Ônibus cheio. Viajar de avião foi bom por algum tempo. E agora, o jeito é acostumar-se com a margarina no lugar da manteiga. O brasileiro almoçou e jantou fora por quase dez anos consecutivos. Voltou a ser luxo o banquete na churrascaria aos domingos.

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Essa desidratação no bolso pode ser consequência da política de distribuição de renda e dos gastos excessivos do Governo, que estimulou crédito acreditando que o consumo alimentaria as engrenagens do crescimento. A fonte secou e os cortes têm sido inevitáveis. A massa de desempregados deve bater à casa dos 10 milhões até o meio do ano. Gente que, inevitavelmente, volta à informalidade para não morrer de fome.

O Brasil está mais pobre, de fato. O dólar caro beneficia os exportadores, mas dá um breque no gosto bom de saborear as coisas no exterior. As viagens internacionais já despencaram pela metade, reflexo do Real enfraquecido. E quem tem a oportunidade de experimentar outra cultura por temporada, não perde tempo. Conheço de perto duas famílias que, por enquanto, desistiram do Brasil. Uma seguiu para Miami, de posse de um green card e uma mala de esperança de melhor educação para o filho e prósperos negócios com nova clientela no ramo de informática. A outra deu a volta no planeta e foi parar na Nova Zelândia, em busca de mais estabilidade, sem as turbulências nervosas do nosso mercado instável.

O ano será de mais adaptações, sem dúvidas. Quase sempre, a vítima é o considerado supérfluo: a TV a cabo, o clube de lazer, a viagem de férias, o almoço fora com a família, o carro novo. Em situações mais drásticas, as contas podem começar a atrasar e o filho terá que trocar de escola. Gostaria de terminar com um aceno otimista ou uma estrada alternativa para um futuro de retomada. Mas ainda não vejo o pote de ouro depois do arco-íris.

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