
Entrevista com Maya Mendes:
Welland, Ontário
Christian: olá! Seja bem-vindo ao Ontário não é só Toronto, o podcast da Brazilian Wave, Canadá. Eu sou Christian Pedersen, editor da Wave, e este é o nosso primeiro episódio. Estatisticamente falando, Ontário recebe por volta de 97 mil imigrantes todos os anos, e isso na última década. Na maioria dos casos, os imigrantes procuram as cidades maiores para morar como, por exemplo, Toronto e Ottawa e, nacionalmente falando, Montreal, Vancouver e outras. A proposta da série de podcasts Ontário não é só Toronto é mostrar brasileiros que moram em outras cidades e regiões da província de Ontário e, através das experiências desses brasileiros, mostrar que é possível morar, estudar, construir uma família e muito mais, em outras cidades da província e não apenas em Toronto.
Christian: Neste episódio, converso com Maya Mendes, uma paranaense que veio para o Canadá em 2012. Agora casada, e com filho recém-nascido, ela e a família se preparam para se mudar de Toronto para Welland, uma cidade de 50 mil habitantes situada na região de Niagara Falls. Neste episódio, a gente conversa sobre por que ela veio para o Canadá, como foi sua experiência em Toronto e por que agora, ela e a família resolveram se mudar para Welland, que fica a 1 hora e meia de Toronto.
Christian: Maya, por que você escolheu o Canadá para morar?
Maya: Eu me mudei para aqui, em maio de 2012. Então, há um pouquinho mais de 8 anos. A princípio era só para eu aprimorar o meu inglês, que na época era tipo “menos 2”. Eu queria uma oportunidade de trabalho melhor no Brasil e daí, por algum motivo, todos os trabalhos pediam inglês fluente. Então, eu pensei: “bom, como posso atingir um nível de inglês melhor?”. E daí eu pensei: “bom, eu vou ficar imersa em uma cultura, em um lugar que as pessoas falem inglês”. E o Canadá, baseado em algumas pesquisas, meio que preenchia os requisitos que eu estava procurando. Eu, na verdade, queria ter ido para a Inglaterra, mas por causa do dinheiro, eu escolhi o Canadá. E eu escolhi Toronto, não sei na verdade, assim, bem exatamente…mas, foi uma questão de identificação. Eu comecei a pesquisar sobre e, vale lembrar que há 8 anos atrás, não tinha esse acesso, não era tão fácil como é hoje. Tinha pouquíssimos blogs, mídias que falavam sobre. Então, foi meio assim, pesquisando. E eu decidi que Toronto seria o meu destino.
Christian: Quais são as coisas que você mais gosta de Toronto?
Maya: Bom, tem várias coisas que eu, realmente, gosto em Toronto. Uma das principais é a questão da segurança. Você tem a segurança de andar com joias, de andar com uma bolsa de marca, com um celular na mão. No Brasil, eu andava com medo: “você põe a bolsa escondida, anda com ela meio…né?”. Eu gosto da questão que você pode se planejar: “ano que vem eu quero fazer uma viagem para a Europa ou sei lá, em dois anos”. Você junta e consegue fazer um planejamento. A questão da economia é muito boa. Eu gosto disso tudo!
Christian: E existe alguma coisa que você não gosta?
Maya: Não gosto que é longe do Brasil. A questão da saudade é uma coisa muito ruim. Essa é assim, a principal. Eu, na verdade, não reclamo do inverno. Eu acho que foi até um dos pontos que me fez vir pra cá. Eu acho legal.
Christian: Por que você e seu marido, agora com filho, decidiram mudar para fora de Toronto? E por que Welland?
Maya: Às vezes, quem tá escutando e que tem um bebê, pode concordar comigo. Eu acho que é meio clichê, mas eu concordo com isso: “tem uma Maya que nasceu junto com o Viktor”. Eu era uma antes dele. A partir de maio, porque, também, é sempre maio…que é um mês, assim, muito importante sempre, na minha vida: foi o ano que eu cheguei aqui, o ano que o Viktor nasceu, que é o bebê. Eu sou outra depois dele, vamos dizer assim. Eu amo Toronto. Eu acho que eu vou continuar amando para sempre, por essa questão: esse agito, esse monte de coisas pra fazer. E eu gosto dessa vibe de cidade grande. Mas, a gente começou a pensar em…, primeiramente, começou que a gente precisava de um espaço maior. A nossa casa já é muito pequena pra gente com um bebê. Sempre funcionou eu e Daniel só, o meu marido. Mas, a gente precisava de um espaço maior. Então, a gente começou a ver opções. E a gente viu que a questão imobiliária fora de Toronto é bem menor. Os valores então! Os preços bem mais baixos. E então, a gente estava vendo pra comprar um condo em Toronto: um valor X. E a gente acabou comprando uma casa lá, bem mais barato do que o condo que a gente estava olhando. Então, claro, pela questão da flexibilidade do nosso trabalho e tudo, foi possível, né? Cada pessoa tem…às vezes quem está me ouvindo, talvez não seja atraído pelos mesmos motivos que nos atraíram para lá. Mas para a gente, deu certo: a questão do espaço, de uma cidade mais tranquila pra ele e, também assim, é perto de várias cidades grandes e tal. Então, né, ele não vai ficar assim alienado do mundo, vamos dizer assim.
Christian: Vocês pensaram em ir para outra região de Ontário?
Maya: Na verdade, não. A idéia inicial era ficar em Toronto mesmo. O que nos levou realmente foi o valor dos imóveis. Então, a gente queria uma cidade que tivesse tudo, que não fosse muito dependente de Toronto. A primeira região que a gente começou a olhar mesmo, para fora de Toronto, foi essa região de Niágara (eu, na verdade, sempre gostei de Niagara-on-the-Lake, que eu acho que é uma cidadezinha super charmosa, super. Tem toda a história e tal do Canadá ali, uma cidade bem importante para a história). E, realmente, o primeiro lugar que a gente começou a olhar fora de Toronto, a gente já gostou e já deu certo.
Christian: Criar um filho em Welland vai ser melhor do que criar um filho aqui em Toronto?
Maya: Eu, por exemplo, sou de uma cidade pequena, no Brasil. Eu já sei como é a vida em uma cidade pequena. Mas eu também acho que as cidades pequenas aqui no Canadá e no Brasil são diferentes. Eu gosto dessa tranquilidade para criar um bebê, uma criança. Eu acho que é interessante. Mas eu também quero que ele tenha acesso a cidades grandes. A gente, com certeza, vai continuar vindo pra Toronto…aqui é só onde a gente vai ter a nossa casa.
Christian: Como é esse processo de mudança? Tem muita papelada, é muito burocrático? Como funciona?
Maya: Bom, tem algumas burocracias, como tudo, né? Como eu sou corretora, eu mesma…eu poderia ter contratado uma outra pessoa lá, para me representar na cidade. Mas, eu resolvi que eu iria me representar. Então, eu que fiz toda a papelada como corretora. Por essa questão de COVID e também, por ter um bebê, eu e meu marido, a gente escolheu que nós iríamos pesquisar as casas, primeiro, só pela internet. Sem visitar fisicamente, primeiro, né? Engraçado que eu até voltei no sistema e falei: “nossa, deixa eu ver qual é essa casa mesmo”, porque tinham tantas que eu fui mandando! Eu fiz um estudo de mercado e chegamos aos valores e tal e começou a negociação. Assim que foi finalizado, na sexta-feira, eles deram a resposta de que eles aceitavam a nossa proposta. No sábado, a gente foi realmente ver a casa. Eu já agendei um home inspector, para… que é o profissional que analisa a estrutura da casa, a condição da casa. E daí, nisso, a gente já começou o processo. Atualmente, o nosso imóvel em Toronto é alugado, então, claro, fala que você tem que dar o sixty days notice, os dois meses de aviso. Agora a gente já está finalizando tudo.
Christian: Toronto tem um bom sistema de transporte. Eu me lembro de que você usava muito a bicicleta. Como vai ser em Welland? Porque lá não tem metrô. Tem alguma ideia de como seria você se locomover? Vocês têm carro, agora?
Maya: Sim, eu era muito dependente da bicicleta. Lá tem o transporte público. Não tem metrô, mas tem um ônibus. Eu ainda não tenho conhecimento do transporte público para dar alguma opinião, comparando com o de Toronto. Mas, sempre vejo os ônibus passando pela cidade. A gente tem planos de ter outro carro também.
Christian: E tem escolas boas por lá? Você chegou a pesquisar isso?
Maya: Sim, tem uma escola. É boa e tipo a uma quadra da minha casa. Eu não sei, realmente, como funciona e eu nunca tive filhos em Toronto. Mas existe, porque está em Ontário, que é uma província muito boa no Canadá. Eu acredito que não seja assim, muito longe do que é em Toronto.
Christian: Você pesquisou algum grupo de brasileiros por lá, alguma associação ou algo parecido?
Maya: Eu até entrei em um grupo. Acho que é “Brasileiros em Niágara”, uma coisa assim. Um grupo no Facebook. Então, assim, tem brasileiros. Eu sei que tem faculdade lá, que tem a Brock University e tem a Niagara College. Então, é uma região que atrai brasileiros, também por causa disso.
Christian: Você acha que vai sentir falta de Toronto?
Maya: Olha, eu acho sim. Toronto me atrai por vários motivos. Eu gosto. Atualmente, por causa do COVID, esses motivos meio que não existem mais. Por exemplo, eu sempre gostava de festivais de ballet, ópera. E isso tudo, por questões maiores… eu não tenho mais frequentado esses locais. E foi até um dos motivos, também, que me fez pensar em sair de Toronto. Porque a gente está perto. A gente pode vir pra cá. Eu acho que vai ser uma experiência assim, interessante.
Christian: Com o tempo, vai ser possível usar o Go-train, o trem de subúrbio, de lá pra cá.
Maya: Sim, mas tem o ônibus também. Tem várias paradas. Até a minha irmã foi nesses dias para Niagara Falls de Toronto. Daí tem várias paradas: tem em St. Catharines, que é uma das cidades maiores ali na região e daí vai a Niagara Falls. No Niagara College tem uma parada no bus do Go-Bus. Não é assim: “ai! Fim do mundo!”.
Christian: E para o brasileiro que está pensando em vir para cá ou até, que mora em Toronto, por exemplo, você acha que existe vantagem em morar no interior, mais do que morar na capital? Você acha que para a pessoa chegar aqui, começar pelo interior seria melhor do que começar por aqui?
Maya: Eu acho que vai tudo de acordo com os objetivos da pessoa. Baseado na minha experiência profissional, eu acho que um dos motivos que trazem as pessoas pra cá, que pesa, vamos dizer assim, é a questão do dinheiro. O life stile de uma cidade pequena é bem menor. Não tem como a gente comparar, né? Com certeza bem menor. Mas também, tem gente que vem para Toronto, como eu vim a princípio, para viver em uma cidade grande. Então, essa pessoa, provavelmente, não vai gostar de lá: um ritmo mais tranquilo e tal. Eu acho que tudo é questão de prioridade, do que você espera no momento. Se você tá procurando numa cidade grande, talvez não seja a cidade mais ideal, né? Mas, se você tá procurando uma cidade mais tranquila, para raise a family como eles falam aqui (que no caso, né, com o meu filhinho e tal…), então, eu acho que, talvez, seja mais interessante. Eu acho que tudo tem um lado bom e um lado ruim.
Christian: Você pensa ou espera que, algum dia, volte a morar em Toronto?
Maya: Ai Chris, é tão difícil de te responder isso! Porque se você me perguntasse essa mesma pergunta em janeiro, por exemplo, eu te falaria uma coisa. Sabe? Eu acho que, igual eu te falei, a COVID, além do baby, todos foram assim…marcos muito fortes, sabe, nesse ano? Se a gente estava pensando em comprar um imóvel em Toronto, daí várias coisas vieram e a gente começou a pensar: “bom, a gente precisa realmente ficar em Toronto?”. Igual eu te disse, essa questão que a gente ama a cidade por vários motivos. E esses motivos meio que estão off agora: “vale pagar o custo que é de morar em Toronto?”, “compensa pra gente?”. O nosso life style, atualmente, se resume a pegar take out, né?. A gente faz tudo pela internet, por exemplo. Então, o meu marido tem essa facilidade, também, no trabalho. Então, para a gente, não fazia diferença onde: a gente está em Toronto, a gente está em Niagara Falls…it doesn´t really matter! Então, por essa questão da flexibilidade, não vai fazer muita diferença.
Christian: O seu marido é canadense. Como ele está lidando com isso tudo?
Maya: Na verdade, eu gosto de Toronto e eu acho que muito mais do que ele. Eu acho que eu vou sentir muito mais saudade do que ele. Como ele tá sempre dirigindo, o trabalho dele meio que exige isso: ele não gosta dessa questão do trânsito em Toronto, que tem ficado cada dia mais complicado. Então, para ele, é um dos motivos, também, que pesa na mudança. Lá o trânsito é bem melhor do que aqui. Para a gente faz sentido, hoje. Mas, pode ser que, sei lá, daqui a seis meses a gente converse de novo e já não faça mais já tanto sentido, né? Então, acho que a gente assim… os brasileiros que estão vindo pra cá, têm que pensar: “o que eu quero da minha vida?”, “ eu quero juntar dinheiro?” , “ eu quero estudar?”, “eu quero pegar meus papeis?” , “qual que é o objetivo de vir pra cá?”. E daí, faz o plano Toronto, o plano Canadá, vamos dizer assim, baseado nesses objetivos.
Christian: Welland fica pertinho de Niágara Falls, que é uma região turística bem famosa. Você sabe de que Welland vive, qual o setor econômico da cidade?
Maya: Bom, Welland tem várias oportunidades de trabalho. Depende da área que você está. Com certeza, tem a questão das escolas, da faculdade que…até, a princípio, minha irmã ia com a gente. Ela até viu essa questão: que tinha o college em Welland e tem, também, a extensão do College Niágara-on-the-Lakes… que é tudo assim muito perto. A área de turismo é uma área bem aquecida lá, por motivos óbvios. Tem as vinícolas que eu acho também, que é um dos pontos fortes da região. Mas, é uma cidade assim: não é uma cidade grande, mas é uma cidade que tem as coisas acessíveis. Também, tem a proximidade com os Estados Unidos.
Christian: Quando você mora no Canadá ou pretende morar no Canadá ou passar uns tempos, algo que é importante de sempre lembrar, é o fator inverno. A cidade de Welland fica ali na região de Niagara Falls e ali também, perto, fica o chamado snow belt, o cinturão da neve. São áreas que ficam perto dos Grandes Lagos, aqui na região do Canadá e Estados Unidos. E lá, recebe mais neve, mais vento…é geralmente mais complicado do que Toronto, por exemplo, que está fora do cinturão. Como vocês estão se preparando pra isso?
Maya: Eu já escutei as duas histórias: “nossa, tem muita neve!”, e isso porque está no snow belt, mas, também, já escutei gente falando que o inverno, lá, não é tão rigoroso como aqui. Eu acho assim, que é ver pra crer, né. Aquele ditado…
Christian: Daqui a um ano a gente te pergunta…
Maya: É…e também, eu acho que os invernos…não sei, talvez seja só a minha percepção disso, mas eu acho que, quando eu cheguei aqui, há oito anos atrás, o inverno era bem mais rigoroso do que é hoje. Esse ano passado, a gente praticamente não teve neve, né? Então, acho que é aquela: você vem para o Canadá já meio que esperando. Não é: “ai, uma surpresa!” ou ”nossa, nem vou!”. É uma coisa que você sabe que vai acontecer. Não sabe quando e quanto, mas, você já tá meio que preparado pra isso.
Christian: Por que uma casa? É mais barato? Tem prédios lá em Welland? Acho que não, né?
Maya: Tem prédios. Então, como a gente viu que na verdade, o budget…em vez de comprar um condo ‒que eu não tenho nada contra. Na verdade, eu super gosto de prédios‒, o meu marido, na verdade, queria uma casa. Até, ele sempre falou que ele sempre sonhou. Porque ele nunca morou em casa no Canadá. Ele sempre morou em prédios e em town house, mas nunca teve uma casa mesmo. Então, uma casa nessa região, em Niágara, é muito mais acessível para a gente do que uma casa em Toronto.
Christian: Que tipo de conselho a Maya de hoje daria pra aquela Maya, de 2012?
Maya: Continue aprendendo inglês, porque você vai precisar muito. E não se distancie das suas culturas, sabe, das suas raízes. Eu sempre gostei de ser brasileira, nunca tive problema de “ai, vim para cá, fugi do Brasil”. Porque tem gente que nem gosta: “ai…eu sou brasileira…”. Não, nunca foi a minha intenção. Na verdade, acabei ficando porque as coisas foram meio que acontecendo. Eu sempre gostei do Brasil. Não tenho nenhum problema com o Brasil e acho que faz parte da sua identidade, que você tem que ser feliz anyway. E é isso, esteja aberta às oportunidades! Eu sou jornalista, no Brasil. Nunca pensei que fosse cair na área de imóveis. Meio que as coisas foram acontecendo e eu acho que é isso. Você tem que ter a cabeça assim aberta…e você vai fazer um trabalho mais difícil que você fazia no Brasil. Eu já fiz limpeza aqui, não vou mentir, né? Acho que muita gente começa assim e não vai ser para sempre. Eu não tenho nada contra também. É um trabalho digno como todos os outros e é só uma questão como eu disse: “não esqueça o motivo pelo qual você está aqui”. Eu acho que tem que ser uma coisa que você acorde e durma pensando nisso. Todos os dias de manhã, quando eu acordo, eu tenho a minha lista de coisas, que eu sou grata ‒eu sei que é uma palavra muito da moda, atualmente‒, meio assim, então: “esse meu dia valeu a pena?”, “acrescentei alguma coisa na minha vida?”, “à minha existência nesse planeta?”. Claro, não sou a melhor pessoa do mundo, mas, eu acho, assim, que você tem que estar bem com você mesma…e porque isso também, já faz a diferença na comunidade onde você está inserido. E nada dura pra sempre, né? Nem as coisas boas, nem as coisas ruins.
Christian: Em nome da equipe da Wave, agradecemos à Maya Mendes pela participação no nosso episódio e vale o esclarecimento de que são opiniões, experiências relatadas pelos nossos convidados. O que não significa que será a mesma coisa para outra pessoa. O importante desses episódios é que as pessoas conheçam um pouco de como é morar e viver nesses lugares. Se você chegou até aqui, agradeço a audiência e até um próximo episódio.